O mundo sabe, e imagina-se que Vanderlei Luxemburgo também, que o esquema que melhor aproveita o talento de Ronaldinho é o 4-3-3. Sistema dos tempos áureos de melhor do mundo no Barcelona e das boas partidas pelo Milan no primeiro semestre do ano passado que renderam alguns apelos a Dunga por sua convocação para a Copa do Mundo na África do Sul.
Ronaldinho é mais decisivo como um meia-atacante atuando pela esquerda. O nome descreve com perfeição seu comportamento em campo. Ele é meia porque recua e procura a bola para pensar o jogo com os meiocampistas e fazer lançamentos e inversões. E é atacante porque precisa jogar solto, sem maiores preocupações defensivas, perto da meta adversária para desequilibrar com habilidade e técnica raras.
Com o elenco atual, Luxemburgo pode imaginar a equipe com Maldonado centralizado à frente da zaga, como gosta de atuar; Willians fazendo a conhecida parceria com Léo Moura pela direita, alternando o posicionamento como lateral e volante, e o reforço Botinelli do lado oposto dando o devido suporte a Egídio, por enquanto o sucessor de Juan na lateral, e ao próprio Ronaldinho.
O novo camisa dez rubro-negro é mais efetivo quando forma o ataque com dois avantes que pedem lançamentos longos, especialmente o ponta-direita nas incursões em diagonal. Foi assim com Giuly no Barça e Alexandre Pato no Milan. No Fla, esse papel pode ser exercido pelo jovem e rápido Diego Maurício, a serviço da seleção sub-20 e pretendido pelo Porto. No centro do ataque, Deivid, mais adaptado ao futebol brasileiro e com uma pré-temporada para entrar em forma, pode ser a referência, o homem da conclusão.
Uma formação possível, com Ronaldinho armando o jogo a partir da esquerda procurando as inversões para Léo Moura e os lançamentos para Deivid e Diego Maurício. Um 4-3-3 que pode ser funcional e equilibrado.
Fechando também com Thiago Neves, como vem sendo anunciado, o desenho do Fla pode ser mantido, mas o comportamento ofensivo muda. O ex-Fluminense também é meia-atacante na acepção da palavra e, assim como Gaúcho, privilegia o trabalho com o pé trocado (esquerdo) para lançamentos e conclusões pela direita.
Com um de cada lado cortando para dentro, mas sem explosão para receber o passe em profundidade, a melhor estratégia é agrupar o time descendo em bloco para que os volantes e os laterais aproveitem os corredores abertos pelos flancos e o atacante mais centralizado não seja bombardeado com lançamentos seguidos. Um estilo que privilegie as tabelas mais curtas e as ultrapassagens. Guardando as enormes proporções, como o Barcelona de hoje. Ou o de quatro anos atrás quando Messi, canhoto como Thiago Neves, jogava pela direita e também procurava o centro com pé trocado.
Com Thiago Neves, o mesmo esquema pode ser utilizado, mas com a equipe mais agrupada, tocando curto e atacando em bloco.
Outra alternativa seria recuar Thiago Neves para a armação no lugar de Bottinelli, plantar Willians com Maldonado e trazer Diego Maurício de volta ao ataque, garantindo profundidade e maior poder de conclusão nas ações ofensivas.
A questão é que o 4-3-3 não costuma fazer parte do repertório do treinador rubro-negro. Se optar pela manutenção do 4-2-2-2 utilizado pelo time titular no empate sem gols contra o Londrina no primeiro amistoso de 2011, é possível pensar num time com Bottinelli e Ronaldinho na armação e Diego Maurício (ou Thiago Neves, se assinar com o clube) fazendo companhia a Deivid na frente.
O técnico pode também voltar ao 4-3-1-2 usado na maioria de suas equipes. Nesse caso, Ronaldinho seria o meia de ligação, com Bottinelli (ou Renato Abreu) fazendo o lado esquerdo do meio-campo. O argentino é um organizador, típico “enganche”, mas pode se sacrificar no esquema para qualificar o passe num meio-campo que já sofre com Willians, raçudo e exímio “ladrão” de bolas, mas que as devolve ao adversário com a mesma facilidade. Renato Abreu tem experiência, liderança e é forte nas bolas paradas. Mas com ele o meio ficaria ainda mais “embrutecido”.
No 4-3-1-2, Ronaldinho faria a ligação com Thiago Neves no ataque e Bottinelli qualificando o trio de volantes pela esquerda.
Ronaldinho até pode atuar no ataque. Jogaria solto, com liberdade de movimentação guardando fôlego para explorar todo o seu talento. No entanto, todas as experiências recentes, como na Olimpíada de 2008, não foram bem sucedidas. O craque ora recua demais tomando o espaço dos meias, ora abre pela esquerda e se isola de seus companheiros. Thiago Neves pode passar pelo mesmo problema, mas já atuou improvisado no ataque, inclusive no próprio Flu, e teve boa adaptação.
A opção tática mais viável neste contexto seria o 4-2-3-1, ensaiado por Luxemburgo no final da temporada passada. Com ele Ronaldinho poderia atuar aberto à esquerda, como prefere, Bottinelli seria o articulador central e Diego Maurício ou o habilidoso Vander (ou Thiago Neves) armaria pela direita, com o trio podendo trocar de posições constantemente. Maldonado e Willians continuariam à frente da zaga.
A alternativa mais interessante: 4-2-3-1, com Thiago Neves, Bottinelli e Ronaldinho se movimentando e encostando no atacante mais fixo.
Independentemente do esquema, o Fla continua com alguns “gargalos” da pífia temporada de 2010: a zaga, com qualquer formação, é insegura, frágil tecnicamente no combate direto e lenta na cobertura; Egídio não parece o melhor nome para ser o titular da lateral-esquerda e os volantes precisam marcar, até para não expor a hesitante retaguarda, mas também fazer a saída de bola com passe certo para que o jogo tenha fluência.
Na frente, além das dúvidas no encaixe dos reforços, há a incógnita Deivid, que ainda não rendeu o esperado com a camisa do clube e não é exatamente um definidor atuando fixo na área. Wanderley, o reforço do ataque até agora, não parece ter “cancha” para ser o titular. Diego Maurício surge como uma alternativa interessante, mesmo não sendo um atacante de área. Mas é preciso saber primeiro se não será negociado agora para o clube fazer caixa e fugir do interesse do parceiro Milan.
O retorno de marketing desejado vai depender do que Ronaldinho e o Flamengo produzirem nos gramados brasileiros. Por toda a novela da contratação, e a má condução do empresário do jogador em vários momentos, muito será cobrado. Até pela enorme diferença de vencimentos do melhor do mundo em 2004/05 em relação aos seus companheiros. Considerando o esforço hercúleo do clube para trazê-lo, o astro certamente terá outros privilégios que podem causar sérias rachaduras no elenco.
Outro problema é que, ao contrário de Ronaldo e Adriano, centroavantes que mesmo acima do peso conseguem ser decisivos nos últimos dez metros pelo posicionamento e a técnica nas conclusões, Ronaldinho atua numa faixa de campo que requer vigor, agilidade, reflexos apurados e alguma velocidade. Com trinta anos, clara decadência física e desempenho não mais que razoável em Milão com final melancólico na reserva, o craque vai ter que se cuidar se quiser brilhar e pensar seriamente na Copa de 2014 no Brasil.
A empreitada não é das mais tranqüilas. O futebol jogado no país não está entre os melhores do planeta, mas é cada vez mais competitivo, com jogos duros, corridos. Ronaldinho tem talento e carisma para subverter tudo e aliar a vida pessoal agitada no Rio de Janeiro ao bom futebol. Se vestir a camisa disposto a suá-la com dignidade, será melhor para todos.
Resta saber se ele ainda quer.
Fonte: Blog Olho tático/globoesporte.com
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